A computação em
nuvem, nos próximos anos, provocará tantos efeitos na sociedade quanto o e-business.
Quando escrevi meu
livro sobre cloud computing, em 2009, o assunto ainda era curiosidade. A
pergunta mais ouvida era: “O que é cloud computing?”. Estamos em 2012 e muita
coisa mudou. Os questionamentos se deslocaram de “vou ou não para cloud?” para
“quando e em que ritmo devo adotar cloud?”.
A computação em
nuvem, nos próximos anos, provocará tantos efeitos na sociedade quanto o
e-business. Hoje, convivemos naturalmente com o comércio eletrônico e internet
banking que, aliás, caminha rápido para se tornar mobile banking. Há uns dez
anos, havia muito receio de usar comércio eletrônico e ter de passar dados dos
cartões de crédito pela internet. Acessar a conta corrente do banco via web?
Era viver perigosamente... Mas tudo mudou. E muito rápido!
Um estudo
interessante da Bain & Company mostrou que há um ponto de inflexão
econômico quando as vendas na internet alcançam 15% das vendas totais de uma
determinada categoria. A partir disso, é grande a possibilidade de fechamento
de lojas físicas e falência de marcas. Um exemplo é a Blockbuster, que fechou
quando as vendas de vídeo online alcançaram 17% do mercado.
O estudo mostrou
que o varejo online canibaliza vendas nas lojas físicas no Brasil, uma vez que
as vendas na internet crescem 24,4% ao ano, enquanto nas lojas físicas o
crescimento é de 11,8% ao ano. As lojas físicas vão acabar? Não, pois sempre
(pelo menos no futuro previsível) teremos consumidores comprando nas lojas
físicas, mas é uma ameaça a quem não investir pesado na internet. Por exemplo,
a Amazon destina 5% do seu faturamento para P&D e o eBay investe 10% da sua
receita no desenvolvimento de novos produtos online. Na prática, se o
consumidor quiser comprar pela web, ele o fará. Enfim, se o varejo tradicional
bobear, pode quebrar mesmo se for uma rede imensa. Blockbuster era um negócio
bilionário...
Esse efeito
avassalador está também ocorrendo no setor de TI com a computação em nuvem.
Entre os usuários pessoais já é de uso comum: Gmail, Dropbox, Picasa, Flickr,
Twitter, Facebook... Usamos nuvens sem mesmo saber. E tecnologias sem
necessidade de um técnico especializado por perto. Simplesmente não existe
curso para usar Facebook. Você abre um perfil e começa a usá-lo. Esse uso
disseminado pelas pessoas físicas gera uma pressão nas empresas para que as
facilidades que encontramos nas nuvens pessoais também estejam disponíveis no
ambiente de trabalho.
O ambiente
corporativo já olha a computação em nuvem por outra óptica. As mudanças
trazidas por esse modelo traz já estão e vão afetar ainda mais, e de forma
significativa, a maneira como adquirimos e utilizamos recursos computacionais,
mudando as relações entre fornecedores de serviços, produtos de tecnologia e
clientes. A própria indústria de TI vai ser obrigada a redesenhar modelos de
negócio. E alguns outros serão criados.
Exemplos? O de
outsourcing tradicional será transformado de maneira radical. Empresas de
serviço desenvolverão negócios voltados à integração entre a nuvem e a maioria
dos ISVs, até por questões de sobrevivência, adotarão nuvem. Ecossistemas em
torno de serviços e produtos de cloud serão desenvolvidos. Essa mudança já está
visível quando analisamos pesquisas, como uma recente realizada pela Saugatuck
Technology, que ao perguntar aos CIOs quais serão as modalidades preferidas
para aquisição de software para os próximos anos, mostrou que, para 2014, a
soma das alternativas exclusivamente em cloud e pelo modelo hibrido cloud + on
premise, ficam com 60%. Adquirir estritamente pela prática tradicional de
vendas de licença on premise ficou com apenas 40%. É, indiscutivelmente, um
movimento irreversível.
Por outro lado, TI
está na encruzilhada da decisão: com cloud poderá criar soluções a custos bem
menores e velocidades bem maiores que no modelo atual. Por outro lado, seu
papel passa a ser mais de broker, buscando e intermediando soluções seja lá
onde se encontrem, na nuvem interna (privada) ou externa. Olhando o exemplo do
varejo tradicional: se a TI de uma empresa relaxar, corre o risco de
desaparecer.
Aí entra a questão
correta: não posso lutar contra cloud, mas como explorar a computação em nuvem
da melhor forma possível? O papel de broker fará com que TI seja também um
“cloud provider”, mesmo para clientes internos. Não é simples. Tem de ser mais
ágil e menos custosa que atualmente. Os benchmarks que serão usados para
avaliar a TI interna serão com os provedores de nuvens, e não com empresas do
mesmo setor ou porte, como hoje.
Exemplo
interessante é o projeto de avaliação da TI, feita pela Bechtel em 2008, quando
ela comparou-se a provedores de nuvem. O texto vale a pena ser lido. Além
disso, como não será capaz de deter a entrada de novas aplicações que operam em
nuvens públicas, a área de TI terá de revisar e desenvolver métodos e processos
(como ITIL), adotando novas tecnologias que garantam não apenas segurança, mas
interoperabilidade entre as diversas nuvens que constituirão o futuro portfólio
de infraestrutura de TI das companhias.
O processo de
migração para o ambiente de nuvem já começou. Pesquisa divulgada pela CIO
Magazine em 2011 já apontava que metade dos CIOs entrevistados estava adotando
a mesma estratégia do governo americano de “Cloud First”. Essa política diz que
o uso de cloud é prioridade em qualquer novo desenvolvimento.
Obviamente que a
migração não pode e nem deve ser feita no estilo “Big Bang”. Existem muitas
barreiras, como cultura da organização, nível de maturidade de TI e mesmo a
abrangência do seu portfólio legado, que muitas vezes podem ser um impeditivo.
As estratégias de cada empresa vão variar, mas me parece bem lógico que um
modelo de cloud bastante comum será o que chamamos de nuvem híbrida, com parte
das aplicações rodando em nuvem privada e o restante em nuvem pública.
A construção de
aplicativos multitenancy, explorando o paralelismo implícito em nuvens,
provavelmente virá com o amadurecimento do conceito na área de TI. No início,
veremos o simples deslocamento de aplicações on premise para rodar em ambientes
virtualizados. Lembrando que virtualização é apenas o primeiro estágio para a “cloudficação”.
Aliás, nunca é demais repetir que a fórmula da computação em nuvem é
virtualização + padronização + automatização + self service.
O ritmo e a
abrangência da adoção de cloud também variam de empresa para empresa. As
organizações da economia criativa, em que praticamente tudo é software, já
começaram na nuvem. Exemplos? Foursquare, LinkedIn, Peixe Urbano, Zynga,
Netflix e outras que não usam data centers próprios, apenas nuvens públicas. A
criação de um negócio em ambiente de nuvem é muito mais simples e barato que
antes. O artigo “Why Sofware is Eating the World”, escrito por Marc Andreesen,
o criador do Netscape e hoje investidor, publicado no Wall Street Journal,
exemplifica claramente um case no qual ele diz que, em torno do ano 2000, operar
um empreendimento na internet custava cerca de 150 mil dólares/mês, enquanto
hoje, em nuvens públicas, o custo caiu para 1,5 mil dólares/mês. A
possibilidade de criarmos, com o uso de computação em nuvem, startups de forma
mais barata e rápida abre um novo campo para o empreendedorismo.
Aliás, o software
está-se tornando a maior vantagem competitiva das empresas. Continuamente,
observamos setores tradicionais do mundo físico, sofrendo disrupção devido ao
software. E inovação em software demanda rapidez de desenvolvimento, porque a
janela de oportunidade se fecha muito rapidamente. Para atender a essa
velocidade, precisamos de um ambiente flexível e ágil, como o que a computação
em nuvem oferece.
As empresas mais
convencionais vão migrar aos poucos, mas qualquer que seja o setor de indústria
em que atua, usarão clouds nos próximos anos. Algumas mais concentradas em
nuvens privadas, como bancos, e outras mais voltadas a públicas, como pequenas
e médias companhias.
Fazendo um
exercício de futurologia... Imaginemos o final desta década... Em minha
opinião, não estaremos mais falando em cloud computing, mas apenas em
computing, pois cloud será o nosso modelo mental de pensarmos e usarmos TI.
Além disso, muitos dos profissionais que construíram o modelo cliente-servidor,
dominante hoje, estarão aposentados ou perto disso, e os novos profissionais
que assumirão posições de gestão já terão convivido muitos anos com nuvem, em
casa e no trabalho. Será natural para eles usarem cloud como modelo natural de
TI. Portanto, cloud computing não deve ser visto como uma iniciativa de simples
cunho tecnológico, de melhoria de infraestrutura, mas sim subordinada a uma
visão maior, estratégica, de reposicionamento da própria empresa no mercado.
Por Cezar Taurion