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segunda-feira, 10 de setembro de 2012

O reflexo da venda vem da gestão

A afirmação é do professor José Luís Meinberg, que defende que a gestão de vendas é a área que menos tem evoluído dentro das empresas. consultor do Instituto MVC Estratégia e Humanismo e professor da Fundação Getulio Vargas, Meinberg é pós-graduado em Planejamento Estratégico pela Columbia University (USA).

Por mais de 20 anos ocupou cargos executivos na CICA, SP, Bacardi, RJ, Heublein, SP, Emulzint, RJ entre outras. Estruturou e tem ministrado diversos cursos voltados para a área comercial de empresas. Sua área de atuação está voltada para a negociação e gestão comercial abrangendo programas de negociação, vendas, distribuição, logística, comunicações, marketing de relacionamento, marketing e gestão estratégica de serviços para o setor do comércio, da indústria e de serviços. Ele é coautor do livro Gestão de Vendas para os cursos de MBA da Fundação Getulio Vargas, editado pela Editora FGV. Em entrevista exclusiva para a VendaMais, o professor fala sobre a realidade atual brasileira de vendas do ponto de vista do marketing, analisa o crescimento da concorrência e ensina como lidar com a crise sem perder a ética. Acompanhe!

VendaMais – O senhor afirma que há uma diferença entre a visão comercial de vendas e a visão de marketing. Que diferença é essa?

José Luís Meinberg – O problema é que as pessoas e as empresas costumam dar título às áreas. Para alguns, gestão comercial e gestão de marketing são a mesma coisa. Qual é a função primordial de marketing? Gerar demanda, atender necessidades do mercado, isso é feito através da área comercial. Na verdade, uma está dentro da outra, depende da outra para poder chegar a um bom resultado. Mas, recentemente, a gente fala mais em gestão comercial. A área de vendas ganha o título de comercial na medida em que ela começa a executar mais funções do marketing. Hoje, uma área de vendas, sem pensar em marketing não existe e vice e versa. A base seria o marketing: o grande estudo, a execução do acesso ao mercado através da área comercial, dependente de uma visão de marketing.

VM – Como o vendedor deve mudar a sua visão para uma mais marqueteira?

JLM – Eu não gosto muito da expressão marqueteira porque está muito próximo da marreteira. Marketing não faz atividades que não gerem demanda de assuntos em que tem necessidades específicas. Eu diria que o vendedor, hoje, tem de ter uma visão de mercado, mais do que simplesmente ser um bom falador, uma pessoa envolvente. Ele só conseguirá vender se tiver um entendimento de mercado. Sem entender as necessidades do cliente não conseguirá sobreviver. Uma das funções principais, entre as funções de venda é a função da informação. Ela é matéria-prima de marketing, mas é matéria-prima do vendedor também. Eu estava lendo exatamente o editorial do Raúl Candeloro sobre relatórios de vendas. Eles tem uma função muito pequena, pois, para gerar informação para a empresa tomar as decisões necessárias, com base na informação gerada, é necessário ter uma amplitude maior. A mesma informação serve para marketing. Então, o vendedor precisa ser treinado em entender marketing, para em seguida entender porque aquela informação é importante. Sem entender a informação, ele não conseguirá gerar dados interessantes que possam gerar informação, que é matéria-prima de marketing. Hoje, o vendedor tem de pensar em marketing.

VM – O senhor afirma que o mercado está mais racional, outros dizem que é cada vez mais importante vender o sonho, a emoção. O que afinal quer o cliente hoje?

JLM – Resolver o problema dele. Eu entendo quando as pessoas estão falando em sonho, porque tudo isso sai um pouco fora do racional do produto, que as pessoas estão tentando verificar uma vida um pouco mais leve, do que simplesmente essa racionalidade. No fundo, as pessoas tomam decisões por razões claras. Mesmo que você fale que comprou uma determinada roupa porque ela é bonita. Bonita é uma sensação mais emocional, mas no fundo esse "bonita" foi relacionado com a ideia de atender a necessidade de estar bonita a um custo, então você racionalizou. É natural que o consumidor nesse ponto saiba estabelecer valor muito melhor do que sabia no passado. Porque ele relaciona a blusa com um custo monetário e um determinado benefício, isso é racional e não emocional.

VM – Com a concorrência dos novos canais de venda, como o vendedor pode apresentar algo mais para o comprador, principalmente se o mercado estiver se tornado mais racional?

JLM – Quando nós falamos dos novos canais de venda, a gente fala do meio eletrônico. A diferença de você usar meios eletrônicos e a venda pessoal é a necessidade que o cliente tem de adaptar-se a uma compra, ou melhor, o vendedor adaptar seu argumento às necessidades do cliente. Nesse sentido, o vendedor para ser presente, para ser valorizado, terá de ter na interface com o cliente aquilo que os outros não dão: envolvimento, adaptabilidade, assertividade, solução de problemas específicos. Então ele tem de se preparar mais do que no passado. Tirar pedidos, que é uma atividade de vendas importante, é mais eficaz feita pelo meio eletrônico do que pelo vendedor. Mas, gerar o pedido é uma atividade que só a venda pessoal consegue fazer.

VM – O que é mais importante para o cliente hoje?

JLM – Ninguém compra o que não quer comprar, muito mais hoje do que no passado. A gente não consegue empurrar "goela abaixo" do cliente um produto qualquer. Para o cliente é importante se relacionar com quem trás valor para ele. Um produto tem valor desde que atenda as suas necessidades básicas a um custo que ele quer pagar. O cliente valoriza pessoas que o ajudam, ele está em busca da relação custo—benefício. O que é benefício para um consumidor é diferente para outro. O benefício responde a uma pergunta objetiva do cliente: o que ele ganha com aquilo que compra? Eu dou sempre um exemplo nas minhas aulas de MBA. Imagine que acabe a cerveja de uma festa. Sem cerveja, a festa acaba também. Então, o dono da festa sai correndo, entra no primeiro posto de gasolina e compra cerveja gelada. O valor monetário que ele pagou é muito maior do que se tivesse comprado durante o dia, mas naquele momento, ele precisava daquela cerveja para a festa continuar e ele pagou mais, isso é que é valor. Essa é a relação custo—benefício.

VM – Como o vendedor pode diferenciar seu produto ou serviço da concorrência?

JLM – Pelo seu próprio serviço. Hoje, o produto é muito parecido com o da concorrência. As tecnologias estão disponíveis. Eu até brinco que tecnologia está na prateleira, é só comprar e produzir, mas a diferença que faz depois de produzir é entregar para o cliente o serviço que pode prestar. O vendedor isoladamente não faz tudo. Por exemplo, se ele promete entregar e a empresa não entrega, não é um problema do vendedor. O bom vendedor será diferente no mercado, tanto quanto ele junto com a empresa oferecerem serviços diferentes ao mercado. Serviços que vão ao encontro das necessidades do cliente, no tempo em que ele precisa, na forma que ele deseja e como quer pagar isso. Não quer dizer preço baixo, de maneira alguma.

VM – Alguns dizem que estamos em crise. Outros, que a situação é a mesma de sempre e que devemos nos adaptar. O que há de verdade em uma e outra situação?

JLM – Desde de que eu me entendo por gente e, já faz algum tempo, eu escuto essa palavra crise. Passa ano, entra ano e sempre tem crise, porque a crise é momentânea. Há uma realidade que podemos considerar hoje sobre o passado. Hoje, você tem muito mais oferta do que no passado. Ou seja, para o mesmo cliente você tem mais pessoas e mais empresas fazendo ofertas. Consequentemente, a sua possibilidade de vender passa por ter mais concorrente e fica muito mais difícil do que era no passado. Então, o vender hoje é mais difícil porque se tem mais concorrência. As ofertas são muito parecidas e tornam, então, essa história que a gente fala de crise. É só você pegar os últimos levantamentos. A própria revista VendaMais falou sobre o número de lojas de varejo que existem hoje e o que existia no passado. Se você tem mais opção para fazer compras, não quer dizer que o mercado está caindo, é que o mercado foi dividido em pequenas partes e esse lojista, que é uma das partes, está tendo dificuldades para vender como vendia no passado. Hoje, é muito mais difícil fazer fortuna, porque se tem menos oportunidade. Acho que é isso que se pode configurar como crise. A crise da venda não é porque não tem mercado, mas porque tem mais concorrente. O vendedor deve se adaptar ao mercado. A gente usa muito a expressão "o foco da venda não é foco no cliente, mas sim foco no foco do cliente".

VM – Qual a principal dificuldade do vendedor hoje?

JLM – Por receber mais ofertas, o cliente está mais exigente. Ele sabe que se o vendedor não atender às suas necessidades, ele vai rapidamente virar para o lado e terá um concorrente que poderá oferecer algo semelhante. Hoje, o cliente está exigindo muito mais por muito menos, porque tem mais opções. O poder saiu do vendedor e passou para o comprador.

VM – Na hora de escolher a sua equipe de vendas, quais as característica que um gerente de vendas deve buscar?

JLM – O vendedor não é bom quando está desenvolvendo uma tarefa que lhe é desagradável. O primeiro passo que eu recomendo é definir claramente o que deseja com aquela tarefa. Vender pode ser tirar um pedido ou prestar uma consultoria de pós-venda. Se você não desenhar adequadamente essas tarefas, você não desenhará um perfil de pessoas para trabalhar. Se sua estratégia de vendas é uma estratégia sob pressão, é preciso contratar gente que aguente pressão, que não será uma pessoa de meia idade, ele tem de ser um jovem que aguenta mais pressão. Se a estratégia de venda é mais consultiva, não será o jovem que vai conseguir isso, porque ele ainda não tem a experiência suficiente para oferecer consultivamente para seu cliente aquilo que ele precisa responder naquele momento. Então é necessário primeiro definir tarefas, depois adequar perfil, treinar o perfil para poder chegar ao resultado desejado. É claro que no meio do caminho você pode ter erros, mas esse é o caminho natural.

VM – O que é ética em vendas? Como um vendedor ético pode enfrentar concorrentes e compradores menos éticos do que ele?

JLM – Esse assunto de ética é extremamente amplo. O que é certo ou errado tem uma relação direta com a cultura. A ética esbarra também pelo que é certo e o que é errado. Um vendedor, ao vender, coloca a seguinte frase: "Este é o último preço que eu posso lhe oferecer". Aí o comprador diz para ele: "Essa sua oferta eu já escutei de outros concorrentes melhores". Naquele momento, ambos estão mentindo, porque estão jogando e isso não é antiético, faz parte do jogo. O antiético seria o vendedor estabelecer vantagens mentirosas em cima de características existentes. Mentir um pouco faz parte do jogo. Agora, exagerar é antiético. Enganar o cliente é antiético. Quando o vendedor sai de uma empresa e leva junto seus clientes, ele não é antiético, pois ele sempre tratou bem os seus clientes. O vendedor é pressionado todos os meses a obter resultados, ou corre o risco de ser mandado embora. Então, ele vai usar de tudo para obter isso. O vendedor, quando é pressionado a trazer pedidos, acaba esbarrando na ética. O responsável por isso é o gestor. O reflexo da venda vem da gestão. Ser ético é um diferencial.

VM – Como um gerente de vendas pode convencer o vendedor que o melhor, às vezes, é dizer não compre para o cliente, quando esse vendedor vive de comissões?

JLM – Aí já temos um problema, que é a forma de remuneração. Não é o fato de dizer não, é a forma de como ele ganha dinheiro. Se ele ganhar dinheiro pela venda que faz, ele vai buscar essa venda. Vender com variável, tem de ser um variável que busque esse valor desejado, para poder dizer não. E não é um variável percentual sobre um valor de vendas que ele vai conseguir que se fale não. Não há mágica nisso, é lógico. Se ele é remunerado por uma variável, você vai ter dificuldades em dizer não para ele. Se ele não enxergar valor para dizer não, vai continuar dizendo sim. Então, o gerente de vendas tem de construir esse valor e rever a forma de remuneração. Se tiver uma remuneração variável de acordo com o valor de vendas, o vendedor vai falar sim, porque no final do mês, ele tem contas a pagar, uma família para sustentar.

VM – O cliente está sendo bombardeado pela concorrência, escolhas, novas tecnologias e opções. É necessário entrar nessa guerra de novas tecnologias e novidades para vender?

A tecnologia vem fundamentalmente da velocidade, da qualidade de informação. O mercado está precisando de velocidade e está sedento por informação. Eu diria que é bastante interessante para uma equipe de vendas estar baseado nessa moderna forma de relação com o mercado. Hoje em dia tem de se pensar em tecnologia. O vendedor tem de ter, se a empresa não lhe oferece, uma agenda eletrônica. Ele tem de ter seu computador, tem de estar ligado na Internet, tudo isso para obter rapidez na informação. Mas, tudo isso não substitui a pessoa que tem a inteligência de fazer as melhores adaptações. Em vendas, quanto mais informação disponível você tiver na hora de falar com o cliente, mais criativa será a sua oferta, isso é tecnologia da informação.

VM – Além dessas novas tecnologias, quais são os outros artefatos que devem ser usados para fidelizar o cliente?

JLM – O cliente será fidelizado, desde que ele enxergue em você valor. O vendedor precisa estabelecer um canal de comunicação com o cliente para que, de uma forma constante, esteja levando informação a ele. Eu pergunto aos meus alunos: "Quantas vezes você foi até o seu cliente apenas para levar um recorte de jornal que interessa a ele? Isso é uma forma de fidelizá-lo com pouca tecnologia. Naquele momento ele não foi vender alguma coisa, foi vender a sua imagem, a imagem da empresa. No momento em que aquele cliente for tomar uma decisão, vai lembrar daquela atitude. O vendedor precisa pensar de forma mais ampla. Relação com o mercado não é apenas para negociar compra e vendas, e sim para negociar relacionamento. Esse é o grande diferencial do vendedor hoje, entender o relacionamento de longo prazo.

VM – Como uma empresa pode integrar de maneira eficiente vendas, marketing e outros departamentos?

JLM – Essa famosa discussão entre marketing e venda é o maior erro que uma empresa pode cometer. Por trás de um bom vendedor, existe uma equipe, uma área de planejamento. O segredo do gestor da empresa é contar para cada área a sua importância com relação ao atendimento de mercado. Se ele não conseguir isso, ele vai ter áreas distantes como é a famosa briga: marketing e vendas, vendas e finanças, cada um quer cuidar da sua área sem pensar que todas essas áreas existem para atender uma única pessoa, que é o cliente. Cada área da empresa tem um papel, que deve ser claramente dito dentro da empresa, para não haver concorrência entre áreas.

VM – Quais são as características de um bom gerente de vendas?

JLM – Em primeiro lugar ele tem de ter muito preparo acadêmico. Tem de ler, conhecer o mercado em que trabalha, o que move esse mercado e conhecer bem a sua empresa. Um bom gerente de vendas tem de saber analisar e concluir, transformar isso em planos. Tem de ser um bom líder, saber trabalhar com números, com comunicação, entender de logística. De toda área de gestão de uma empresa, a que menos tem evoluído é a de gestão de vendas. Hoje, para se obter resultados melhores, a empresa tem de melhorar seus gestores. Eles precisam crescer e para isso é preciso estudar, se preocupar constantemente com o que há de moderno por aí. Educação continuada é fundamental.

VM – Muitos gerentes premiam sua equipe de vendas apenas pelo volume de negócios, já que outras características como satisfação do cliente, por exemplo, não são tão visíveis. Como medir esses outros resultados que não aparecem em números?

JLM – Perguntando para o cliente, por exemplo. Estabelecer uma metodologia para obter esse resultado. É pesquisando. O cliente é quem deve responder sobre seu grau de satisfação. Isso não é uma ferramenta complicada. Você tem de mostrar para o cliente que responder aquela pergunta vai lhe trazer algum benefício, senão, ele não vai falar sobre isso. É através do cliente que você tem os melhores resultados de satisfação. Eu gostaria de ver uma empresa remunerando seus vendedores pelo índice de satisfação do cliente.

VM – Qual foi o pior e o melhor exemplo de gerência de vendas que o senhor já viu?

JLM – Eu vou dar dois extremos, sem falar especificamente de algum. O pior exemplo é aquele gestor de vendas que se preocupa só com a própria vida. Na obtenção de resultados o benefício é dele e não da equipe. Ele busca seus objetivos a ferro e fogo, tratando mal a equipe e desvalorizando os funcionários. O exemplo ao contrário é o melhor exemplo. Aquele que o gerente quase não aparece na operação. Ele não aparece no mercado, porque é a sua equipe que está aparecendo e ele dá valor a isso. O melhor gestor é o facilitador da tarefa do vendedor.

VM – Quais são as responsabilidades de um gerente de vendas? É possível ele desenvolver uma visão maior de marketing e ao mesmo tempo estar ligado ao cotidiano da empresa?
JLM – É obrigação do gerente de vendas ter uma visão de marketing. Na verdade, a função de marketing está cada vez menos em marketing e mais nas áreas que estão mais próximas do mercado, porque são eles que têm mais informações e mais conteúdo sobre a situação. O gerente de vendas tem de ter uma visão maior de marketing do que no passado. Por isso que eu não vejo as áreas de forma separadas, elas são complementares. Ele precisa ter uma visão de marketing e não uma visão operacional.

VM – Uma dica para o profissional de vendas.

JLM – Prepare-se. Não pode ser simples. É preciso conhecer a empresa, o produto, o mercado. É preciso se preparar e se atualizar sempre.

Fonte: Redação VendaMais


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