Desde que me tornei autônomo
vivo um dilema toda vez que tenho que enviar uma proposta comercial para um
cliente: quanto cobrar?
Alguns serviços têm substitutos
semelhantes no mercado e, ao menos, é possível ter algum padrão de comparação,
por mais distante que um esteja do outro. Outras atividades, no entanto, são
altamente personalizadas e, portanto, difíceis de serem comparadas. Precificar
tais ofertas torna-se, assim, um maravilhoso exercício de criatividade.
Muita gente gosta de cobrar bem
caro para depois ir reduzindo o preço até finalmente chegar naquilo que
realmente deseja - infame prática conhecida como "queimar
gordurinhas". Se você estiver vendendo um curso de Negociação ou de
Persuasão (como é o meu caso) e vender por $3 um troço que cobrou $10
inicialmente, fica claro que você não entende nada do assunto que pretende
ensinar.
Uma das soluções (sempre sugeridas) é cobrar por hora. Desde o início do meu vôo solo tenho a impressão de que esta é a melhor maneira de destruir valor, de subavaliar aquilo que você faz e prender-se a um padrão de custo do qual dificilmente você conseguirá se livrar depois.
Enquanto dividia minhas atrozes
dúvidas com meus colegas de Facebook recebi, através do Daniel Grillo, a preciosa indicação do texto Declaration of
Independence, do Verasage Insitute.
Então, fez-se a luz! E o que era uma impressão tornou-se uma convicção.
O texto citado é um verdadeiro
manifesto contra cobrar serviços por hora - especialmente em se
tratanto de trabalho essencialmente intelectual. Vejamos alguns dos argumentos
dos seus autores:
.: A ideia da cobrança por hora
baseia-se nas teorias de Karl Marx, que pregam que o valor de um
produto (bem ou serviço) é função direta da quantidade de horas empregadas na
sua elaboração. Basta lembrar que, em tarefas intelectuais, quantidade guarda
pouca ou nenhuma relação com qualidade;
.: A prática concentra a atenção
no Tempo e não na Criação de Valor, que deveria ser o compromisso primário de
um Fornecedor com seu Cliente, empurrando o prestador para a mediocridade,
relegando a busca pela excelência a um segundo plano. O que importa é ficar lá
no Cliente e não fazer algo realmente significativo;
.: Cobrar por hora penaliza os
Avanços Tecnológicos, já que quanto mais você melhorar sua Produtividade, menos
receberá do seu Cliente;
.: Ao cobrar por horas
trabalhadas, o Fornecedor passa todo o risco da relação para o Cliente (que
coisa mais óbvia!), numa afronta direta aos interesses deste último;
.: Cobrar por hora faz com que o
Cliente pague pela Curva de Aprendizado do Fornecedor, tornando o custo dos
serviços posteriores arbitrários e injustos;
.: Cobrar por hora é um estímulo à
desonestidade, uma vez que os controles são improváveis em qualquer esfera.
Imagine que um Cliente me pague R$ 1.000,00 por hora para eu resolver um megaproblema e que eu, por sorte ou por genialidade mesmo, encontre a solução em seis minutos. Mas em vez de falar na hora eu enrolo por dez horas. Resolvo o problema, ganho R$ 10.000,00 e o cliente fica muito satisfeito da vida.
Na sua visão eu seria desonesto,
porque deveria ter ganho apenas R$ 100,00 por 10% de uma hora efetivamente
trabalhados. Na minha visão eu seria um idiota completo.
Agora pense nos seguintes
profissionais cobrando por hora: Dentista (quanto mais demorar para
arrancar/obturar seu dente, mais dinheiro ele ganha), Jogador de Xadrez (não
importa ganhar, mas ficar lá sentado), Datilógrafo (catador de milho
profissional), Escritor, Lutador de Boxe, Arquiteto, Salva-vidas. Desastroso,
não?
.: Cobrar por hora não diferencia
uma empresa da outra, mas compara uma com a outra. O hábito coloca tudo no
mesmo saco, transformando o Capital Intelectual - exatamente o que diferencia
uma empresa da outra - em commodity. "Tonhão, me vê aí meia hora de
inovação!"
.: O pagamento por horas impõe um
teto ao seu rendimento, limitado à finitude* do seu tempo. Para ganhar mais, ou
você cobra mais ou trabalha mais. Não adianta ser mais criativo e inovador nem
mais produtivo.
Não à toa Daniel Pink, um dos mais
inovadores escritores da atualidade, identifica a hora bilhetável (billable hour)
como um dos maiores vilões da Motivação. Segundo ele, a prática tira do
trabalhador boa parte da sua Autonomia - um componente essencial à Motivação,
juntamente com a possibilidade de Aprimoramento e o Propósito daquilo que se
faz.
Revendo estes conceitos, a impressão
que tenho é que adotar o pagamento por hora implica em renunciar aos valores
que adotei quinze meses atrás. Significa voltar a uma realidade onde o
empregador parece não valorizar aquilo que você realmente tem a oferecer - além
da sua pontualidade.
Por Rodolfo Araújo
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